“Cruella” conta uma história de origem e desvinculada da vilã da animação “101 Dálmatas”. É mais um live-action de animação da Disney focado na vilã, como já havia acontecido com “Malévola”.

O filme está disponível no catálogo do Disney+ e nos cinemas.

Um filme com alma própria

Antes de mais nada, é bom deixar bem claro que, aos sensíveis às mudanças, “Cruella” pode não ser uma boa pedida. Quem espera um live-action/adaptação das animações clássicas da Disney super fiel ao original, provavelmente vai se decepcionar com esse filme, já que ele mantém pouco além dos nomes dos personagens e algumas menções como a presença dos dálmatas na trama. Em um tempo dominado por vilões cada vez mais complexos em grandes blockbusters, como Thanos e Killmonger, ou até mesmo filmes inteiros voltados para esses personagens, como “Coringa” e os fracos “Venom” e “Malévola”, “Cruella” acaba sendo um prato cheio para as intenções da Disney.

Antes de tratar a obra como uma grande inovação para o estúdio, é sempre bom entender os motivos financeiros que motivaram tal mudança. Por mais que grande parte do público espere sempre remakes fiéis às animações (pelo menos em relação à história), como vemos nos sucessos de bilheteria de “Aladdin” e “Rei Leão”, o novo filme do estúdio não surge como uma opção viável para tal fidelidade. Isso porque a vilania clássica e simples de personagens como Cruella, Jafar, Malévola, entre outros, saiu de moda há algum tempo. O público, ainda que muitas vezes inconscientemente, prefere cada vez mais obras menos puramente maniqueísta com vilões que cometem atos malvados sem qualquer motivação maior.

Entendendo tal lógica de mercado (que sempre será o foco da Disney), o estúdio se permitiu experimentar e para isso escolheu Craig Gillespie, que já havia feito um ótimo trabalho com a complexidade de Tonya Harding em seu último filme: “Eu, Tonya”. Com carta branca para tornar Cruella em protagonista e anti-heroína, o cineasta volta a romper com essa busca alucinante pelo realismo (que parece dominar Hollywood atualmente) e constrói uma abordagem muito mais calcada no exagero, o que certamente combina perfeitamente com a personalidade da personagem de Emma Stone.

Critica Cruella Disney 2

Aproveitando a Londres dos anos 1960, tanto visualmente como por meio das músicas, Gillespie faz de Cruella um símbolo de rebeldia, de transgressão, de confronto. Contrastando sua personalidade a da vilã vivida pela sempre dominante Emma Thompson, a protagonista se mostra uma desafiante à altura ao romper com os padrões da moda e da alta sociedade, o que pode ser entendido como um questionamento a toda sociedade e o que é tido como certo e errado. Além disso, coloca a “transgressora” como um símbolo feminista, alguém que rejeita  imposições (ainda que acertadamente o longa nunca aborde tal temática diretamente ou em diálogos).

Ao mesmo tempo, as mais de duas horas de filme parecem não pesar, já que o exagero de Gillespie domina a tela de forma envolvente, por meio de longos planos-sequência com câmera acelerada, uma câmera sempre flutuando e tentando captar a grandiosidade daquela história que tá sendo contatada, além das músicas que entram com destaque sem medo de soar brega ou genéricas, o humor que dita o tom mais sombrio-divertido do filme, com algumas piadas acertadamente mórbidas, e as belas atuações sem nunca pretenderem o realismo das rivais que se desafiam em um jogo para lá de interessante.

É bem verdade que “Cruella” pode soar meio genérico em várias dessas escolhas ou ser questionado por uma história cheia de reviravoltas novelescas e personagens secundários com pouco desenvolvimento, mas o grande foco da obra está em centrar a trama nas duas personagens opostas e, principalmente, encontrar uma cara nova, algo raro nos live-action de animações do estúdios, que parecem sempre tentar se equilibrar entre agradar aos fãs mais puristas e apresentar poucas ideias mais atuais (ou agradar o público chinês em busca de bilheteria, como “Mulan”). Por mais que ainda tenha que fazer concessões para atingir um público mais família, “Cruella” é sem dúvida a obra que melhor rejeita esse meio-termo se comparada as suas anteriores.

Nota: 7.0

Assista a minha crítica em vídeo:

Assista ao trailer:

Ficha Técnica:

Título original: Cruella
Data de lançamento: 27 de maio de 2021
Direção: Craig Gillespie
Elenco: Emma Stone, Emma Thompson, Mark Strong, Paul Walter Hauser
Gêneros: Comédia, Suspense
Nacionalidade: EUA