“Marighella” acompanha alguns anos da vida de Carlos Marighella, ex-deputado e líder da luta armada contra a Ditadura Militar, tratado pelo regime como o maior inimigo do Brasil
O filme está disponível nos cinemas.
Um filme nervoso
Apesar de seguir uma estrutura meio batida de cinebiografia, Wagner Moura estreia na direção de “Marighella” sem medo de incomodar e com o senso de perigo e caos que o período retratado pedia.
Alvo de radicalizações e críticas, em grande parte por pessoas que nem sequer assistiram ao filme, “Marighella” se mostra desde o plano-sequência inicial dentro de um trem, passeando por vagões com urgência até a fuga, um filme nervoso e caótico, ambos adjetivos empregados no bom sentido aqui. Moura entende do período retratado e do senso perigo para aqueles que se opunham à ditadura, independente se essa oposição pegava em armas ou simplesmente publicava matérias de jornal contra o regime.
Com isso, ele compõe uma encenação claustrofóbica e agoniante, principalmente por meio de uma câmera sempre fechada no rosto dos personagens, movimentos nervosos, uso constante de sombras e atuações que parecem sempre levar os personagens ao seu limite emocional. Até mesmo Seu Jorge, em mais uma grande atuação e que tenta controlar suas emoções em prol da liderança do grupo, não consegue esconder toda a pressão e o perigo da situação.
É bem verdade que a habilidade demonstrada por Moura na direção não aparece na forma como ele estrutura o roteiro e tenta criar momentos. A fórmula da cinebiografia repetida à exaustão ao longo dos anos é a mesma, enquanto falta refino aos diálogos e sobretudo na tentativa de sustentar o seu discurso por texto, e até mesmo na construção de algumas cenas.
O cineasta não resiste à tentação de tornar óbvia a sua mensagem, que já tinha ficado clara por outros elementos formais e diálogos e não precisava ser reforçada. Um bom exemplo disso está na primeira transmissão da Rádio Nacional Libertadora, em que o diretor apela para filmar figurantes reagindo àquela mensagem e concordando com o discurso.
Mas talvez o que mais sofra com isso é o personagem de Bruno Gagliasso. Fica difícil culpar o ator já que ele faz exatamente o que é pedido pela direção e até dá um pouco de credibilidade para um personagem muito mal escrito. O filme tinha duas alternativas ao criar o regime, diminuí-los da equação e praticamente tirá-los de tela ou ridicularizá-los por completo, como funciona bem na cena que cruelmente os torturadores riem do torturado em contra plongée. Só que Moura prefere uma terceira alternativa, uma caricatura séria desse vilão, que definitivamente não funciona.
Só que claro que nada disso vai importar para grande parte do público, que está mais interessado na forma “tendenciosa” como o protagonista foi retratado. Longe aqui de defender ou contestar as ações do personagem, exigir uma “imparcialidade” da direção é pura tolice, é desconhecer o cinema e suas possibilidades. E vamos ser sincero, muitos que defendem isso só querem clamar pelo imparcial enquanto no fundo acreditam naquelas baboseiras de “ameaça comunista” e defendem aquela ditadura que durou 21 anos e tanto matou, censurou e torturou. Se você não gostou, mas não faz parte desse último grupo, argumente contra a obra e o seu retrato histórico sem recorrer a essa pseudo imparcialidade.
No fim, é um bom filme de estreia para Wagner Moura, que entre erros e acertos, não está nem aí para o que vão falar sobre o seu filme. Essa tal liberdade artística falta a muitos cineastas mais experientes.
Nota:
Assista ao trailer:
Ficha Técnica:
Título original: Marighella
Data de lançamento: 4 de novembro de 2021
Direção: Wagner Moura
Elenco: Seu Jorge, Humberto Carrão, Bruno Gagliasso
Gêneros: Drama, Baseado em Fatos Reais
Nacionalidade: Brasil