“Noite Passada em Soho” acompanha a jovem Eloise, que se muda para Londres para fazer faculdade de moda. Porém, logo que chega à cidade começa a ter visões da década de 1960 e acompanhar Sandy, uma mulher que ela nunca conheceu.

O filme está disponível nos cinemas.

Entre o Giallo e o Surrealismo

Edgar Wright não abre mão do seu cinema de referências em seu filme mais sério e socialmente relevante da carreira.

Wright construiu toda a sua carreira passeando por gêneros e subgêneros que ama, mas sempre dando a sua forma aos longas, sobretudo por meio de piadas e uma narrativa visual, algo que vemos por exemplo na sequência em que Nicholas Angel, em “Chumbo Grosso”, se transporta para a cidade pequena e o diretor não recorre a nenhum diálogo para demonstrar seu tédio. Ou também quando todos os personagens lutam contra um zumbi usando pedaços de pau/tacos de sinuca, em “Todo Mundo Quase Morto”. Outro exemplo é a sequência de abertura de “Em Ritmo de Fuga”, em que vemos a importância da música na vida daquele personagem.

Só que, se até então Wright sempre teve um interesse mais cômico, como percebermos ao olharmos para todos os seus filmes, inclusive aqueles que flertam com o terror (“Todo Mundo Quase Morto” e “Heróis de Ressaca”), mas o faz mais como homenagem do que como forma, em “Noite Passada em Soho” ele finalmente abandona o cômico para usar as referências a fim de levar o espectador a sensações extremas, quase psicóticas.

O cineasta nos transporta então para Londres e faz da grande cidade a ambiguidade que sustentará o longa. Inicialmente vista com o otimismo da oportunidade pela protagonista, em um primeiro ato sem muita inspiração e que, para nos localizar e apresentar a personagem recorre a alguns clichês como o das bully sem identidade, aos poucos a cidade começa a se revelar para gente. Mais do que isso, o filme começa a revelar sua verdadeira identidade por meio da cidade.

Critica Noite Passada em Soho 2

A Londres fria então ganha cores, o mundo contemporâneo se transforma nos anos 60, antes visto com um olhar saudosista pela protagonista, em intersecção entre sonho, realidade e mundo sobrenatural, começa a mostrar que os problemas de hoje não começaram agora. Pelo contrário, esquecemos que eles eram muito piores.

Eloise, interpretada pela magnífica e insegura Thomasin McKenzie, então vira Sandy, vivida pela segura e decidida Anya Taylor-Joy, e têm seus sonhos quebrados pela cidade. Se no passado isso se dá por conta de uma sociedade puramente misógina, nos tempos atuais isso não muda, mas Wright demonstra algum otimismo na figura de John, o único a ficar ao lado de Eloise.

Wright então não perde a seriedade do tema de vista, transforma suas referências em formalismo, buscando as cores e os elementos exagerados do giallo italiano, ao mesmo tempo que pisa no surrealismo, sobretudo no ato final, para tematicamente mostrar como a sociedade sempre prefere taxar as mulheres de loucas, e faz o público questionar junto a sanidade de Eloise.

A própria oposição das atuações reforça a temática ao mostrar que independente dos sonhos, da segurança ou insegurança, do talento e da força de lutar pelo que deseja, a sociedade sempre vai fazer de tudo para machucar e desacreditar as mulheres, seja fisicamente, como acontece no passado mais fortemente, ou com uma pressão psicológica quase velada, mas igualmente prejudicial, como acontece atualmente.

Wright então faz o seu filme se revelar aos poucos ao espectador, enquanto mantém a identidade do seu cinema, mesmo abordando um tema mais relevante com a seriedade que este pedia. O terror vira um dispositivo para a construção temática-estilística.

Nota: 148839148839148839148839

Assista ao trailer:

Ficha Técnica:

Título original: Last Night in Soho
Data de lançamento: 18 de novembro de 2021
Direção: Edgar Wright
Elenco: Thomasin McKenzie, Anya Taylor-Joy, Matt Smith
Gêneros: Terror, Thriller
Nacionalidade: EUA