“Viúva Negra” mostra Natasha confrontando o seu passado e tentando derrubar, ao lado de sua família, a agência que a criou como espiã.
O filme está disponível no catálogo da Disney+ e nos cinemas.
Precisava existir?
“Viúva Negra” se vê refém e não consegue se livrar das amarras de ser apenas uma peça minúscula de um universo maior. É um reflexo da Marvel pós “Vingadores: Ultimato”, uma ressaca que permanece para um MCU que tinha sua finalização perfeita com o último Vingadores, mas preferiu privilegiar o seu valor comercial e o dinheiro que seguirá ganhando com novos filmes e séries (na forma de assinaturas no Disney+). Com isso, temos uma sequência que começa com o terrível “Homem-Aranha: Longe de Casa” e continua até “Viúva Negra” (e deve seguir nas próximas obras) que estão mais preocupadas em acrescentar alguns elementos ao universo e cumprir um calendário de tantos filmes e séries por ano do que necessariamente em funcionar dentro delas mesmas.
Então, a personagem que está desde o terceiro filme de um universo de 13 anos finalmente ganha o seu filme solo. Porém, longe de valorizar a sua protagonista, o longa está mais interessado em apresentar novos personagens, organizações e situações que podem ser usados em futuros filmes. Tal escolha só enfraquece a personagem-título, que se torna apenas um artifício de roteiro, já que dramaticamente o seu arco já havia sido definido anteriormente.
Entretanto, tudo isso poderia ser facilmente contornado se “Viúva Negra” tivesse alguma pretensão em funcionar dentro de si mesmo, explorando o potencial da agência russa e focando no lado da espionagem, muito bem sucedido no melhor filme do MCU: “Capitão América: Soldado Invernal”. Ou até mesmo indo a fundo nas temáticas abertas, como a identidade, a família e o tráfico de mulheres para a criação de um exército mentalmente manipulado. Só que tudo isso fica só na superfície, não é dado nenhum passo adiante, pois isso exigiria certa seriedade, o que nem a Disney nem a Marvel querem para o universo divertidinho de heróis.
É bem verdade que o longa até investe uns bons longos minutos para tentar desenvolver uma relação entre Natasha e Yelena, e das duas para com seus “pais”. Só que, mais uma vez, toda possibilidade de algum envolvimento com os personagens é constantemente quebrado por piadas fora de hora ou momentos constrangedores na busca por divertir com o que não tem espaço para piada (como as “irmãs” tirando um sarro do “pai” ao falarem sobre como a sala vermelha tirou a fertilidade delas).
Tudo bem que tal relação de romper o desenvolvimento dramático com comédia está longe de ser uma novidade na Marvel e até funciona em grande parte dos filmes do MCU. Entretanto, essa escolha simplesmente não cabe em uma obra que retrata uma personagem já morta no universo e que deveria ter suas relações pessoais como o grande diferencial. Fica claro que “Viúva Negra” está mais interessado em Yelena (personagem que seguirá no universo) do que na protagonista, tornando Natasha quase uma coadjuvante de seu próprio filme solo. Então voltamos a questão inicial, é mais uma vez a Marvel se importando mais em posicionar personagens e obras em um escopo maior (universo), e, tirando assim, o foco daquela obra em específico. A personagem merecia muito mais do que isso.
Dessa forma, resta ao público apenas as cenas de ação e uma série de caricaturas (boa parte delas desrespeitosas, como a forma em que os russos são retratados, com destaque para o sotaque “russo” nos diálogos em inglês e o vilão malvadão agressor de mulher) e resoluções vergonhosas, sendo as principais quando o filme faz questão de inserir flashbacks para explicar os seus deus ex-máquina (um exemplo é a troca de rostos).
Ainda assim, Cate Shortland consegue trazer uma boa energia na sua primeira hora, quando se preocupa mais em avançar a trama por meio de sequências de ação do que em diálogos, ao mesmo tempo que rejeita parte do realismo que se faz tão presente no MCU. A fuga da “família” no prólogo e a perseguição que termina no metrô são dois bons exemplos de como o filme se sai bem enquanto ação escapista e humana. Então, quando isso vai sendo deixado de lado em prol de um suposto desenvolvimento de personagens e narrativo, o longa entrega a sua identidade e tenta se resolver com reviravoltas tolas e sequências de ação grandiosas, que em nada combina com a proposta inicial para a personagem e os que estão em seu entorno.
“Viúva Negra” não é o pior filme da Marvel, talvez não esteja nem entre os cinco piores, mas é, com toda certeza, o longa mais esquecível e desnecessário do MCU. É uma pena para uma personagem tão querida que a Disney/Marvel muitas vezes esteja mais interessada em lançar filmes apenas para preencher calendário e ganhar dinheiro. Natasha Romanoff foi a vítima da vez dessa prática antiartística.
Nota: 4.0
Assista ao trailer:
Ficha Técnica:
Título original: Black Widow
Data de lançamento: 9 de julho de 2021
Direção: Cate Shortland
Elenco: Scarlett Johansson, Florence Pugh, David Harbour, Rachel Weisz
Gêneros: Ação, super-herói
Nacionalidade: EUA