Questão política e HQ

Watchmen sempre foi uma história política, talvez a HQ de “heróis” mais política de todos os tempos. Portanto, criticar a escolha da série em se centrar na questão racial é desconhecer por completo o material original.

Logo, o que a série faz nada mais é do que atualizar a história para uma questão relevante nos dias de hoje. A HQ se passava durante a Guerra Fria, a disputa entre duas potências, Guerra do Vietnã, heróis corrompidos em um EUA rompido. Esse contexto não faz mais tanto sentido atualmente, então Damon Lindelof (showrunner da série) opta por trazer o ódio como foco da narrativa. Dessa forma, ele mantém a história política e socialmente relevante, ao mesmo tempo que desenvolve personagens e questões filosóficas e científicas. Porque sim, o ódio e o racismo seguem existindo em alta dose na nossa sociedade.

Porém, não é apenas de crítica social que vive a série. Lindelof demonstra o conhecimento necessário do material fonte e, a partir dele, vai criar um universo novo, mas que a todo instante se entrelaça com o original. Isso vai desde as referências e personagens até a criação de resoluções para coisas que a HQ tinha deixado em aberto, como por exemplo o “Justiça Encapuzada”. O showrunner usou o desconhecimento da origem do personagem e seu uniforme para conectá-lo à temática da série.

Watchmen 1

Ficção científica e narrativa

Além disso, Lindelof entendeu como funciona o Doutor Manhattan e a sua questão com o tempo e a humanidade. Um fantoche que pode ver as cordas, mas não é capaz de mudar o futuro. Até porque não existe futuro e passado para ele. E a figura do fantoche vai ser muito bem representada no 7º episódio.

E, graças a questão temporal do Manhattan, Lindelof envolve a estrutura da série em um grande “Paradoxo de Bootstrap”, ou seja, o futuro influenciando o passado de tal forma que as coisas acabam não tendo um ponto de origem certo. O famoso “quem veio primeiro, o ovo ou a galinha?”. O que vai de encontro à expressão de Laurie: “Milagre Termodinâmico”.

Dessa forma, a narrativa começa confusa, com peças soltas, e aos poucos o quebra-cabeça começa a se resolver. Mas isso só funciona porque todas as peças já estavam sugeridas desde o início, mesmo que não ficasse tão claro à primeira vista.

Um bom exemplo é a revelação do episódio 8 sobre o Doutor Manhatan. O Will já tinha falado sobre ele ser uma pessoa para a Angela em tom de brincadeira, o Cal dirigia um carro azul e a Laurie disse para Angela que achava o marido dela bonito. Mas nós não ligamos os pontos imediatamente, pois a série soube esconder as pistas.

Personagens

Outro foco importante da série é em seus personagens. Por isso, ela não tem vergonha de gastar episódios inteiros para desenvolver apenas um deles. Há capítulos destinados ao Will, a Angela, a Laurie, ao Manhattan, ao Looking Glass e ao Ozymandias. Dessa forma, compreendemos as motivações, passado e toda a mente de cada um deles. Pois não há como tratar de temas complexos com personagens rasos.

E, por sorte, as atuações são boas o suficiente para nos aproximar ainda mais dessas pessoas. Só assim somos capazes de ter imersão na narrativa e sentir que estamos lado a lado com todos ali presentes.

E, assim, vivenciamos uma experiência complexa, relevante, pesada, humana e filosófica, tudo ao mesmo tempo, em uma disputa constante por poder.

Nota: 10.0

Assista ao trailer:

Ficha Técnica:

Título original: Watchmen (História de um Casamento)
Data de lançamento: 16 de dezembro de 2019
Showrunner: Damon Lindelof
Elenco: Regina King, Jeremy Irons, Tim Blake Nelson, mais
Gêneros: Drama, Ficção científica
Nacionalidade: EUA