“Fundação” se passa em um futuro distante e acompanha Hari Seldon, um matemático que prevê o futuro da humanidade. Usando a psico história, ele revela que o império galáctico está ruindo e é exilado em um planeta distante com seus “seguidores”.
A série está disponível no catálogo da Apple TV+.
Abrindo mão da obra original
A primeira temporada de “Fundação” abre mão dos acontecimentos do livro para construir um sci-fi futurista, mas genérico.
“Fundação” é uma daquelas obras de difícil adaptação por causa do funcionamento do mercado audiovisual. Isso porque o material original clama por um alto investimento, o que a Apple não poupou dado o tamanho e os detalhes da produção. Porém, é também uma das maiores obras de ficção científica da história, escrita pelo mestre Isaac Asimov, e interessada muito mais no desenvolvimento da humanidade por séculos do que no escapismo.
Chegamos então a uma contradição: como atrair o público para uma série que pouco tem dos elementos mais “populares” dos blockbusters atuais?
Com isso, os criadores David S. Goyer e Josh Friedman escolhem não adaptar a obra original, mas “se basear em”. Falando o português mais claro, eles abrem mão de uma manutenção mais fiel do que acontece no livro, contentando-se com uma criação nova a partir daquele mundo que Asimov criou, o que certamente desagradará aos fãs mais puristas.
Dessa forma, ele enfraquece o núcleo da fundação (que no livro é o único realmente trabalhado) e fragmenta a narrativa em pelo menos três pontos da galáxia. O sci-fi mais cerebral dá lugar a cenas de ação e “poderes” pré-concebidos a alguns personagens. Fica claro que a dupla tem dificuldade em trabalhar a essência da obra para um público que desconhece o texto de Asimov e se entrega a elementos mais genéricos dos filmes atuais e das décadas passadas de ficção científica.
Assim, a obra que influenciou grande parte do que veio depois no cinema do gênero, como Star Wars, torna-se influenciada por aquilo que ajudou a conceber. Esse não era o único caminho possível, e certamente não era o mais profundo artisticamente, mas Goyer entende bem o público geral (não à toa é um dos responsáveis pela adaptação do Batman na trilogia de Christopher Nolan) e sabe que na maioria das vezes o já conhecido vende mais do que o novo.
Por outro lado, o que eles criam do zero, basicamente todo o núcleo do império, apresenta uma consistência muito maior. É quase como se esse núcleo se parecesse mais uma adaptação de uma obra de Asimov que nunca existiu. Lee Pace dá então vida um personagem complexo, demonstrando sempre a autoridade do imperador experiente, mas ainda jovem, só que sem deixar de revelar uma certa dúvida em muitas de suas ações.
A clonagem surge como um elemento interessante para a manutenção de um império que vive preso ao passado. Asimov nada escreveu sobre isso, mas certamente aplaudiria a criação de algo que tanto se encaixa na sua obra. Longe da caricatura e do convencional, os criadores conseguem aqui explorar com profundidade a prisão e os questionamentos sobre a humanidade de seres fabricados para governar a galáxia. Além disso, a religião, como aconteceu em quase todos os impérios ao longo da história, é necessária para validar a tríade, fazer o povo acreditar que aqueles são seres divinos nascidos para governar. Ao mesmo tempo, a igreja pode se transformar na maior inimiga dos Cleons da vez.
Então, sob a sombra de um dos maiores escritores que o mundo já viu, Goyer e Friedman se mostram mais confortáveis quando libertos a criar do zero, transformando a primeira temporada de “Fundação” em uma obra agridoce para os fãs do original, mas fácil de vender para quem nunca teve contato com Asimov. E todo o trabalho estético ao criar grandes mundos particulares é louvável, a Apple definitivamente entrou no mercado do streaming.
Nota:
Assista ao trailer:
Ficha Técnica:
Título original: Foundation
Data de lançamento: 19 de novembro de 2021 (último episódio)
Elenco: Jared Harris, Lee Pace, Leah Harvey
Gêneros: Ficção científica, Fantasia
Nacionalidade: EUA