“First Cow” conta a história da amizade e parceria de um americano e um chinês no Oregon da década de 1820. Eles aprendem a sobreviver roubando leite da única vaca da cidade para vender bolo.
Desconstrução do faroeste
“First Cow” é mais um passo dado na filmografia da diretor Kelly Reichardt rumo a desconstrução do faroeste clássico, ao mesmo tempo que é um filme típico da A24, distribuidora que investe em um cinema independente e autoral e que encontrou o seu público graças a alta qualidade da grande maioria de suas obras. E, como já se tornou quase uma marca da distribuidora, o novo longa de Reichardt também aposta na proporção de tela mais quadrada (razão de aspecto 4×3), que remete aos filmes clássicos e já foi usada em obras como “The Lighthouse”, “First Reformed”, e muitas outras da A24, o que aos poucos começa a se tornar um clichê se não tiver uma função muito clara no longa.
Além disso, a diretora volta a ambientar seu filme no Oregon, como já fez em “O Atalho” (2010), que também desconstrói o velho oeste que estamos acostumados a ver no cinema. Então, ao invés de estruturar a história por meio de duelos, perseguições, heróis e vilões, Reichardt aposta no seu minimalismo característico para falar sobre o capitalismo, tanto na época quanto atual, como fica claro no prólogo do longa.
Então, acompanhamos a jornada cotidiana de dois homens simples e solitários, que buscam um forma de sobreviver em um mundo escasso e hostil. E o mais belo é que a diretora opta por filmar essa hostilidade por meio da simplicidade e da beleza natural. À primeira vista tudo parece tranquilo e habitável, mas logo percebemos que aquele lugar está longe de ser agradável.
Capitalismo e personagens
Por isso, a diretora não tem medo de humanizar os seus protagonistas, mesmo quando esses tomam atitudes questionáveis. É como se aquelas decisões fossem necessárias para colocá-los em algum grau de competição com o comandante local, o que desconstrói a visão de que o capitalismo é um sistema justo e igual em oportunidades. Isso fica claro na forma como ela filma e desenvolve os diferentes personagens. O protagonista e seu parceiro e os nativos são personagens que geram empatia, enquanto os comandantes britânico e americano aparecem como figuras detestáveis e que gozam dos seus privilégios enquanto discursam sobre igualdade.
Porém, Reichardt não torna nada disso óbvio demais, o filme preza muito pela sutileza nas ações, assim como desenvolve a narrativa com a mesma calma e minimalismo da composição daquele universo. É bem verdade que em muitos momentos a obra exige um pouco de paciência do espectador, enquanto o longa não tem pressa alguma ao acompanhar as ações e a relação de seus dois personagens mais importantes.
Dessa forma, a diretora não sacrifica sua obra com um clímax grandioso. Ela mantém exatamente a mesma beleza poética que usa para filmar a vaca, que dá nome ao longa (“First Cow” – Primeira Vaca, em tradução livre), pela primeira vez, uma simplicidade poderosa que encerra o longa de forma semelhante a como ele se iniciou.
Nota: 9.0
Assista ao trailer:
Ficha Técnica:
Título original: First Cow
Data de lançamento: Sem estreia no Brasil
Direção: Kelly Reichardt
Elenco: John Magaro, Orion Lee, Toby Jones mais
Gêneros: Drama, Faroeste
Nacionalidade: EUA