“O farol” conta a história de dois homens que vão trabalhar por duas semanas tomando conta de um farol. Mas o problema é que o isolamento e a convivência começa a tornar o local em algo insuportável para eles.

Divisivo e brilhante

Robert Eggers (A Bruxa) consegue encontrar brilhantismo e originalidade em um cinema divisivo. Em um momento em que a sétima arte borbulha remakes, sequências desnecessárias e blockbusters genéricos, sempre visando a criação de franquias e tratando cada filme como apenas um produto lucrativo descartável, Eggers é um dos poucos a tentar algo novo. Ele pouco se importa se seu filme vai fazer sucesso com o público ou se vai ter boa bilheteria, porque o seu comprometimento é com a visão que deseja transmitir e a história que quer contar. Isso se torna mais significativo ainda em um gênero como o terror, o que coleciona o maior número de clichês.

Se em “A Bruxa” (sua obra de estreia) ele apostou em um terror atmosférico que construía tensão sem mergulhar de cabeça por completo no gênero, em “O Farol” o diretor não tem medo de se assumir por completo como um longa de terror, ainda que esse seja focado muito mais na psicologia de seus protagonistas do que na externalidade das ações.

O foco aqui não é aproximar os personagens do público e, sim, construir pessoas misteriosas. Assim, não podemos confiar neles, não sabemos do que são capazes e nem o que estão pensando. É uma grande viagem pela mente dois desconhecidos que enlouquecem em um local onde nenhum de nós permaneceria são.

Dessa forma, Robert Pattinson e Willem Dafoe entregam duas atuações que captam o mistério e perigo de seus personagens. E a partir da repetição de tarefas, isolamento, convívio com uma pessoa completamente oposta, vemos a loucura de cada um surgir aos poucos, ainda que de forma diferente entre eles. A construção é calma, os planos são longos e a imersão só vai funcionar se o espectador não ter pressa de chegar direto ao ponto.

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Referências ao cinema clássico

Outra escolha estética interessante de Eggers é retornar ao cinema clássico. Ele utilizou câmeras da década de 1920 e a proporção de tela mais quadrada, que não é comum hoje em dia. Porém, tais escolhas não são apenas estilização barata. Além do preto e branco em película ajudar a construir essa loucura quase primitiva nos personagens, a proporção de tela ajuda a tornar o filme mais vertical, explorando melhor a altura e a grandiosidade do farol que dá nome ao filme.

Esses elementos ajudam também a construir toda a ambientação, que nada mais é do que o personagem principal do longa. O diretor escolheu por gravar no local ao invés de filmar em estúdio. Com isso, o que presenciamos é o uso de um som ambiente, uma fotografia imersiva, uma trilha enlouquecedora que contrasta com o som ambiente do lugar e uma montagem que começa quase imperceptível, mas se reinventa e se faz mais presente de acordo com o crescimento da loucura dos protagonistas. Tudo caminha em uma sintonia caótica controlada proposta pelo diretor.

É uma aula de cinema nos mais diversos sentidos da palavra, uma obra inesquecível que marca o século e abre portas para uma abordagem diferente no gênero de terror. Mas mais do que isso é a prova de que a liberdade criativa e a visão autoral de um diretor faz toda a diferença.

Nota: 10.0

Assista ao trailer:

Ficha Técnica:

Título original: The Lighthouse (O Farol)
Data de lançamento: 22 de janeiro de 2020 (1h 50min)
Direção: Robert Eggers
Elenco: Robert Pattinson, Willem Dafoe mais
Gêneros: Terror, suspense
Nacionalidade: EUA