“The Green Knight” acompanha Gawain, sobrinho do Rei Arthur, que parte em uma jornada para encontrar o cavaleiro verde, um ano após cortar a cabeça deste.
Revisando o heroísmo
Em determinado momento do filme, Sir Gawain (Dev Patel em sua melhor atuação da carreira) diz: “temo não ter sido feito para grandeza”. Tal frase resume praticamente toda as escolhas feitas pelo diretor David Lowery, já que “The Green Knight” tem como objetivo principal subverter o heroísmo dos contos épicos de cavaleiros, transformando-o em uma jornada pessoal mais preocupada em descobrir a fantasia e o peso do tempo naquele mundo, enquanto o cineasta busca a essência de seu próprio cinema.
Talvez o maior erro do material de promoção de “The Green Knight” tenha sido vender o filme como um possível terror medieval. Por mais que em alguns momentos o longa até flerte com elementos de horror, Lowery está muito mais interessado na fantasia, tanto nos elementos da narrativa como nas escolhas visuais (fotografia, design de produção e CGI).
O filme se inicia com aquela pose de superioridade típica dos filmes da A24 (que em muitos filmes se justifica, enquanto em outros soa como puro exibicionismo intelectual, tudo sempre depende do diretor no comando da obra), como a iluminação fraca a fim de criar um suspense com as sombras, a fala pomposa, os personagens se comunicando com dificuldade e os planos mais longos.
Só que, aos poucos, Lowery vai transformando essa pompa até meio realista em uma jornada fantástica, dramática, mas despreocupada. Há sim uma escolha meticulosa de enquadramentos, movimentos de câmera e iluminação para tornar os planos vistosos, mas em nenhum momento o diretor esconde sua busca estética. É quase como se Lowery e Gawain estivesse juntos nessa viagem, e o diretor fosse descobrindo junto com o protagonista uma forma de mostrar aquele mundo.
Não à toa, o realismo vai sendo quebrado cada vez mais no plano, a câmera se faz presente (travellings e panorâmicas sem sutileza), o CGI não tem medo de parecer artificial (a raposa, os gigantes), assim como os acontecimentos da história (o cavaleiro verde, a mulher sem cabeça, a mansão) e a estética (a névoa constante e uso de cores mais vivas pouco realistas).
Ao mesmo tempo, Lowery vai anunciando a tragédia (despedida da namorada, longo plano saindo à cavalo da cidade, o teatro de fantoches, os ossos do protagonista) em uma narrativa em que o tempo se faz presente como um fardo, assim como o machado, a arma que o colocou na viagem e o acompanhará por toda ela, mesmo que ele não saiba exatamente o que procura com essa jornada. E, por mais que já suspeitemos do final, o roteiro nunca revela o que vem exatamente a seguir. A causa e a consequência se perdem em meio ao tempo, e o interesse é voltado sempre para o próximo estranho encontro, independente de qual criatura fantástica virá a seguir.
Com isso, os personagens secundários deixam de ser apenas personagens para se tornarem parte da arquitetura daquele mundo. Se eles soam estranhos demais é porque assim se sente Gawain com seu próprio futuro incerto e as coisas que ele não entende (heroísmo, a vida e a morte). Ele não terá grandes feitos, mal entenderá quem realmente é, mas pelo menos viverá uma experiência fantástica.
Então, em meio a muitos excessos e caprichos, “The Green Knight” se mostra como uma subversão dos contos épicos arthurianos mais preocupado com a descoberta da essência do protagonista (e do diretor para com seu próprio cinema) em meio ao peso do tempo e do fantástico.
Nota:
Assista ao trailer:
Ficha Técnica:
Título original: The Green Knight
Data de lançamento: Sem data de estreia no Brasil
Direção: David Lowery
Elenco: Dev Patel, Alicia Vikander, Sean Harris
Gêneros: Fantasia, Terror
Nacionalidade: EUA