“The Handmaid’s Tale” traz um futuro distópico, em que os EUA se tornou Gilead, uma nação dominada por uma religião radical. Nessa sociedade restritiva, cada pessoa tem uma obrigação social a ser seguida.

Importância da série

“The Handmaid’s Tale” (ou “O Conto da Aia”) surgiu como uma série necessária e que funciona como um alerta. A primeira temporada é impecável e retrata com perfeição um universo vasto e singular, que mostra o perigo que o extremismo religioso e os discursos de ódio podem trazer. Além da temática, a série consegue trazer visualmente a ideia de um universo único.

A paleta fria simboliza a falta de emoções que aquela sociedade propõe. O uso excessivo de lens flare aparece geralmente nos momentos em que June (Elizabeth Moss) está sozinha como sugestão à pequena esperança presente em sua vida. E claro, os marcantes figurino e design de produção trazem a homogeneidade proposta pelo comando de Gilead. Já o vestido vermelho das aias contrasta com o restante, pois essas são as únicas capazes de gerar vidas novas para essa sociedade.

Técnica impecável

Apesar da terceira temporada sofrer com sérios problemas narrativos, a parte técnica segue impecável. É impressionante a riqueza de detalhes presente em cada composição de cena. Não é comum se ver na televisão uma preocupação tão grande com a mise-en-scène. Cada personagem é posicionado em um lugar planejado, não só para que o enquadramento seja bonito visualmente, mas também para que cada take traga um sentido extra para a cena.

Portanto, seja no uso de contraplongée (câmera posicionada em baixo do personagem) para engrandecer a figura que detém o poder da cena ou no trabalho de enquadrar os personagens mais ao centro ou às bordas da tela, sempre há uma razão para a utilização de determinado recurso.

É interessante como cada cena é pensada para fugir do convencional plano e contra-plano, utilizado na TV e no cinema há décadas.

f53b64bd 08f3 421a 945f 9171a80628de THT JS 313 0428RT

Já o roteiro…

A parte mais problemática da temporada se encontra justamente no desenvolvimento da narrativa. Ainda que haja uma evolução em determinados pontos em relação a segunda temporada. É bem-vinda a substituição da criticada violência física excessiva da ano anterior por um abuso mais psicológico, que traz mais peso para as críticas que a série quer trazer. Porém, em muitos momentos os discursos se tornam óbvios e redundantes, principalmente no uso do voice over. Essa é a temporada que faz pior uso dele. Muitas vezes explicando a crítica que a série quer trazer, algo que já estava explícito nas ações do roteiro e que não precisava ser mastigado.

Por outro lado, apesar do desgaste narrativo, é possível ressaltar como o roteiro consegue aprofundar temas como o arrependimento e o resquício de bondade presente em pessoas que aceitam aquele sistema e cometem atos horríveis. Adianta se arrepender depois de levar tantas pessoas à desgraça física, psicológica e moral? Esse é o conflito central que ganha força sobretudo no personagem Joseph Lawrence (Bradley Whitford). Ele surge como alguém enigmático e perigoso, mas aos poucos suas motivações vão ficando mais claras. A tentação de ter o poder nas mãos o levou a criar um sistema político que se tornaria sua desgraça.

Personagens complexos

E ao abandonar o maniqueísmo completo, a série dá mais camadas aos seus personagens, principalmente na figura de Serena Waterford (Yvonne Strahovski), que é desenvolvida sobretudo pela figura da maternidade. E até June começa a ter a sua moral questionada agora. Ela está longe de ser uma heroína sem falhas que já foi um dia, o efeito de viver em Gilead se mostra cada vez mais presente na personagem.

Porém o grande problema sem dúvida aparece no caminhar desordenado e cansativo da narrativa. Essa é a temporada que mais pesa a mão em reviravoltas desnecessárias que são colocadas para preencher o espaço para conseguir chegar a 13 episódios. Principalmente entre o sexto e o nono, fica evidente a quantidade de cenas que aparecem sem nenhuma força narrativa. Sendo que muitas delas são ignoradas pouco tempo depois. Essa falta de causa e consequência só serve para cansar o espectador e mostrar que em muitos momentos a série não sabe direito para que caminho seguir.

Quebrando as próprias regras

É uma pena também que ao estender mais do que precisava a narrativa, a série é obrigada a quebrar as regras do universo impostas na primeira temporada. Ao acrescentar reviravoltas, a temporada exige que June burle ainda mais o sistema, o que em muitos momentos faz com que ela seja pega. Só que ao contrário das severas punições que as aias sofriam nas temporadas anteriores (muitas vezes até com a morte), como por exemplo a Ofglen e a Ofwarren, fica claro que o roteiro não pode aplicar a mesma punição a sua protagonista.

Dessa forma, fica o sentimento de que o roteiro sempre vai encontrar uma medida de salvar a June, mesmo que isso desvirtue o que havia sido criado anteriormente. Um exemplo claro disso é a não consequência por roubar um bebê de Gilead, crime mais terrível que alguém poderia cometer naquela sociedade infértil. Outro é a conveniência narrativa por meio de uma personagem aleatória que acontece no décimo primeiro episódio.

A questão do bebê é ainda mais séria, já que a própria série reconhece seu erro quando June fala para Fred Waterford (Joseph Fiennes): “Você foi misericordioso,  depois de tudo, eu ainda estou viva”. E por muito menos a Marta responsável por cuidar da filha de June foi assassinada.

Futuro da série

Apesar dos deslizes, “The Handmaid’s Tale” segue como uma das melhores séries do momento. E as pontas soltas deixadas pela terceira temporada podem trazer um desfecho épico. Desde que a série saiba o momento certo de acabar. A quarta precisa ser a última!

Nota: 7.5

Assista ao Trailer:

Ficha Técnica:

Título original: The Handmaid’s Tale (O Conto da Aia)
Elenco: Elizabeth Moss, Yvonne Strahovski, Joseph Fiennes, Ann Dowd, mais
Gêneros: Drama, Futuro distópico
Nacionalidade: EUA