“Nova Ordem” retrata um México tomado por manifestações contra a desigualdade ao mesmo tempo que acompanhamos um casamento luxuoso. Os protestos servem de pretexto para os militares tomarem o poder e implementarem um regime autoritário e sangrento.
O Filme foi exibido na 44ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, que está acontecendo no formato online em 2020.
Discurso contraditório
Vencedor do Prêmio Especial do Júri do Festival de Veneza e obra de abertura da 44ª Mostra Internacional de São Paulo, “Nova Ordem” é o novo filme do polêmico diretor mexicano Michel Franco. Em apenas 80 minutos, o longa se mostra como uma interessante e brutal distopia em curso, ainda que bastante falha. Acompanhamos logo de início um México dominado pela revolução popular, seguido pela tomada do poder pelos militares e terminando com tudo que esse governo é capaz de fazer (a chamada Nova Ordem), desde a censura e enclausuramento da população até as prisões, torturas e execuções.
O longa abre alternando um casamento de elite e os protestos pelo país, trazendo assim um contraste entre as duas classes financeiramente opostas da população, até o momento em que elas convergem com a tomada da festa pelos revolucionários, que resulta em saques e assassinatos. Com belas escolhas visuais, sempre colocando o sangue (vermelho) e a tinta (verde) em destaque como uma forma de simbolizar a nação em erupção (a bandeira mexicana tem as cores verde e vermelho), o cineasta constrói um caos controlado, em um primeiro ato que é de longe a parte mais acertada do filme.
A partir de então, Franco começa a se perder em seu próprio discurso, fazendo com que a narrativa vá enfraquecendo e dê lugar apenas ao choque pelo choque. Apesar da propor a mensagem de que toda a população sai perdendo em uma ditadura, tanto os ricos quanto os pobres (não à toa a elite não é poupada e acaba por financiar sua própria destruição), o roteiro escolhe Marianne, a noiva rica e de bom coração, como a única personagem com algum desenvolvimento no longa, criando assim, uma disparidade entre as classes e uma falta de empatia do público para com os mais pobres.
Sem nos importarmos com todos os personagens do longa, exceção feita à protagonista, toda a proposta visual e narrativa perde força. As mortes sucessivas de figurantes têm um impacto bem inferior ao desejado, assim como as cenas de tensão envolvendo os personagens secundários também não nos deixam tão apreensivos quanto deveria.
Além disso, o filme perde a chance de debater mais profundamente questões sérias como a influência da corrupção e da elite para a desigualdade, a instabilidade das instituições que permitem a entrada de governos autoritários, o excesso de poder e a visão autocrata das forças armadas, as diferenças raciais como geradores de desigualdade, entre vários outros temas.
Definitivamente, é um filme que poderia ser marcante, tanto em sua brutalidade quanto com um subtexto socialmente relevante, atual e capaz de espelhar boa parte das nações mundiais. Porém, a falta de desenvolvimento dos personagens e a quase inexistente contextualização do cenário político e social mexicano criam um discurso ambíguo, em que não seria loucura apontar os pobres como os grandes vilões do longa. Essa pode até não ter sido a ideia de Franco, mas isso pouco importa, já que tal interpretação foi tirada a partir de sua problemática execução.
Nota: 5.5
Assista ao trailer:
Ficha Técnica:
Título original: Nuevo Orden
Data de lançamento: 22 de outubro de 2020
Direção: Michel Franco
Elenco: Naian Norvind, Diego Boneta
Gêneros: Drama
Nacionalidade: México